27 Mar Sobre o neocaudilhismo e quem o apoia
Da organização já havia pouco, ou mesmo nada, a esperar. Mas há sempre uma fronteira que se presume nunca vai ser ultrapassada, considerando o que está em causa e a sua natureza. É verdade que a sua natureza é promíscua, uma vez que está fundada sobre a conciliação dos interesses dos trabalhadores e dos patrões. E daí ter subscrito todos os acordos em sede de concertação social, até aqueles que têm subvertido os interesses daqueles que dizerem querer defender e representar, os trabalhadores. Trata-se da UGT e do seu congresso. Por alguma razão, a CGTP e a UGT são como a água e o azeite: não são miscíveis.
Ao convidá-lo para abrir o seu congresso, a UGT colocou mais um tijolo no edifício do projecto daquele que num ano de mandato já se configura como o primeiro caudilho português – Marcelo Rebelo de Sousa. Já não é o caudilhismo de outros tempos. Não tem arruaceiros fardados, tem filas de aderentes em busca de um instante de glória em comunhão com o eleito. É o neocaudilhismo do século XXI e das novas tecnologias, que se instalou em pleno regime democrático e alimenta-se dele. É o neocaudilhismo daquele que invade as vinte e quatro horas da vida de um povo, e caracterizado pelas relações pessoais estreitas e emocionais que estabelece com os seus seguidores, apelando para a sua adesão acrítica e incondicional. É o neocaudilhismo casual, aquele que se dirige ao espelho e o que questiona – espelho meu, espelho meu, há caudilho mais caudilhista do que eu? É o neocaudilhismo que tem na promoção da alienação colectiva a sua principal fonte de rendimento.
Sendo a UGT a central sindical que decorre de uma aliança entre o PS e o PSD, dos tempos da Carta Aberta, ela representa o que MRS persegue deste que há um ano tomou posse, o consenso, a todo o custo e custe o que custar. Daí ter sido convidado para se dirigir aos congressistas da UGT. Além de um passo para aumentar o seu poder real e simbólico, foi um sinal de que os patrões podem continuar a contar com aquela estrutura sindical para imporem as suas condições aos trabalhadores. Mas a sua presença teve outro significado. Ao ser aprovado uma moção que colocou a possibilidade da realização de uma greve geral, fora de qualquer contexto, a UGT aproveitou a circunstância, e o Presidente da República ficou historicamente ligado àquela decisão.
Que tenha memória, nunca a UGT, por sua iniciativa, deu este passo, de ameaçar com uma greve geral da função pública. Considerado o actual contexto político, esta ameaça tem o valor de uma provocação, é preciso que se diga e seja tomada como tal; não se trata de uma greve que decorre de negociações falhadas, é uma acção que, descontextualizada, tem uma evidente componente política, neste caso dirigida contra este governo. Depois da direita ter tentado criar um clima de instabilidade política a propósito da troca de uns sms entre Mário Centeno e o senhor António Domingues, a propósito do processo da sua contratação para a direcção da CGD, é a UGT que em congresso apanha aquele testemunho e faz dele a razão principal da reunião congressual. Porque quanto ao mais não passou de ruído de fundo para fazer de conta que se defendiam os interesses dos trabalhadores. Foram, portanto, estes os protagonistas do reforço do consenso caudilhista: MRS, UGT.
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