23 Jan Sobre o livre arbítrio
Por força da petição promovida pelo movimento Direito a Morrer com Dignidade vai ser discutida na Assembleia da República, no próximo dia 1 de Fevereiro, a morte medicamente assistida. Alemanha, Bélgica, França, Holanda e Suíça, com enquadramentos jurídicos distintos, são actualmente os países europeus em que se pratica aquele acto, cuja finalidade é cumprir uma decisão de quem está perante uma doença terminal, seja ela de que natureza for. Embora tenha sido necessário que na Declaração Universal dos Direitos Humanos, http://www.ohchr.org/EN/UDHR/, ficasse inscrito que todo o indivíduo tem direito à vida, no mesmo artigo também ficou consagrado que todo o indivíduo tem direito à liberdade, assumindo-se que o livre-arbítrio está indissoluvelmente ligado ao direito à liberdade, que são causa e consequência um do outro e inserindo-se naquilo que Isaiah Berlin defende ao afirmar que “para uma escolha ser livre o agente deve ter sido capaz de agir de outra maneira”(Quatro ensaios sobre a liberdade, Fundação Roberto Marinho).
Embora o livre-arbítrio esteja sistematicamente a ser ajustado às normas sociais e aos códigos de conduta em vigor, no plano dos direitos humanos agir de outra maneira representa dilatar as fronteiras dessas normas e desses códigos, tornando a liberdade mais complexa e conferindo-lhe, ao mesmo tempo, atributos que, estando latentes, a sua expressão está limitada pelos estereótipos e representações sociais dominantes. Ao se estabelecer um nexo entre liberdade, escolha e livre-arbítrio está também a defender-se que na escolha estarão sempre presentes as várias alternativas que só se poderão manifestar na condição de se estar perante a informação mais completa no momento.
A morte medicamente assistida decorre da vontade e da tomada de consciência de que a melhor alternativa é a ajuda e o apoio da indução da morte. Mesmo sendo já prática generalizada nas instituições de saúde a prevenção da dor e a promoção do conforto físico e psicológico para quem se encontra nessas condições, seja qual for a sua duração, é desejável que exista sempre uma alternativa disponível, a qual deve ser objecto de um tratamento que tenha em vista satisfazer a vontade livremente expressa. Tanto mais que, sendo a morte uma imanência de se estar vivo, morrer nas condições que se deseja constitui a concretização de uma vontade irrepetível e que, por essa razão e por ser um acto exclusivamente individual e único, não deve ser objecto de escrutínio sancionatório, qualquer que ele seja.
Se morrer não é separável de viver porque não há transcendência que os separe ou se lhe oponha, a assistência na morte representa o gesto que melhor a compreende e mais contribuiu para a enquadrar dentro da categoria dos fenómenos naturais.
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