O retrato da pobreza na Madeira

O retrato da pobreza na Madeira

A manchete de hoje do Diário de Notícias da Madeira detém a parangona: “Mais de 700 famílias pedem ajuda”, estando a ajuda alimentar no topo das solicitações de 724 famílias dos vários concelhos da região.

Na verdade, os números da pobreza costumam destoar, entre os que são oficiais e os de quem anda no terreno, estes últimos a penderem para mais realistas – neste ponto, quem não se lembra do tempo em que alguns governantes defendiam que era necessário esconder a miséria para salvar o turismo?

O desemprego na Região é o segundo mais elevado do país e são cerca de 45 mil, os trabalhadores em lay-off, sobretudo no ramo da hotelaria. Muitas famílias têm-se deparado com a mudança de hábitos, forçada, e resta-lhes recorrer a ajudadas estatais – e, sabemo-lo, tantas vezes essa ajuda, sobretudo assistencialista e nunca resolutiva, não chega a todos… Perante o actual cenário socioeconómico, agravado pela pandemia e pela incerteza do que nos delegará o futuro, teme-se que muitos possam passar à situação de pobreza crónica se não se recriar a capacidade de empregabilidade na região.

É verdade que se têm criado programas específicos para dar resposta às dificuldades de tantas famílias, mas estes – e sendo naturalmente necessários – são sobretudo alimentares, descurando outras necessidades igualmente prementes como a saúde (as listas de espera agravam-se exponencialmente), a educação (a pandemia pôs a nú as desigualdades entre os estudantes madeirenses e a falta de capacidade de muitas famílias de os assistirem no tempo de confinamento), a habitação (criando-se, é verdade, medidas de adiamento de pagamento das rendas face à quebra de rendimentos, porém, discriminando muitas outras famílias que são alojadas por municípios de cor política diferente – sim, há governantes que não o são para todos os madeirenses) e o emprego condigno (sem se exercer a força fiscal ao patronato, que além de usufruir do dinheiro do lay-off ainda submete os seus trabalhadores a um horário integral com rendimento parcial). Em situações de crise  as resoluções   têm-se restringido  ao assistencialismo e  à “caridadezinha” e não à intervenção na base radicular do flagelo da pobreza. E quem não se lembra ainda do famigerado PAEF na região, em que se defendiam, mais do que a resolução estrutural da crise, a criação de cantinas assistenciais e de cartões para a aquisição de alimentos?
A verdade-  diz -nos empiricamente a história dos anos mais recentes – é que a eficácia dos programas que defendem a maioria dos governantes, fica aquém dos resultados necessários para a efectiva erradicação da pobreza na região.

Aliás, mesmo já tendo sido proposto a nível parlamentar por forças da oposição, ainda hoje não há sequer um plano regional para a erradicação da pobreza nem tão pouco um laboratório social para aprofundar o estudo da pobreza na Madeira e assim, mediante uma monitorização, encontrar soluções, programas mais eficazes e operacionalmente práticos e adequados, e definir estratégias concretas ante a realidade da pobreza madeirense.

Pois além dos que já estão efectivamente em condição de pobreza são ainda aos milhares os que estão em risco de pobreza e de exclusão social, e, paradoxalmente, na sua maioria são assalariados, pelo que é urgente que se encontrem soluções políticas!

Porque é às entidades governamentais responsáveis pela área social e do direito ao trabalho e à habitação, que cabe, constitucionalmente, desenvolver todas as ações, para a prevenção e combate das causas e factores de risco de pobreza de modo a que todos os cidadãos tenham a mesma dignidade social!

 

 

 

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Sílvia Vasconcelos
vasconcelos.silvia@gmail.com

Médica Veterinária, doutorada em Ciências Veterinárias, componente biomédica sobre os benefícios dos animais para saúde mental dos seres humanos. Actualmente dirigente nacional e coordenadora regional do Movimento Democrático das Mulheres, foi também deputada pela CDU na Assembleia Legislativa da Madeira. Foi ainda actriz no Teatro Experimental do Funchal, integrando vários projectos artísticos de teatro e de televisão desde 1986.

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