25 Out Não oiço, não faço, só prometo
Uma notícia recente do jornal Público https://www.publico.pt/sociedade/noticia… dá conta de que entre Janeiro e Agosto os serviços de urgência dos hospitais do SNS realizaram mais 195 000 mil urgências do que em igual período de 2015. Considerando que até 31 de Dezembro ainda vão ser contabilizados os episódios de quatro meses, a que se devem acrescentar, para o efeito, a procura decorrente dos riscos associados à sazonalidade, aquele valor andará por volta dos 350 000. Comparada com o valor da meta fixada pela tutela para 2016, menos 225 000 urgências, temos então um desvio de mais de meio milhão de urgências. Que nos faz lembrar outros tempos, em matéria de cumprimento de metas.
Nestes dados, o que interessa e é relevante em matéria de planeamento e organização dos serviços públicos de saúde é, por um lado, o voluntarismo na fixação daquela meta, e por outro, a inércia que tomou conta do sector. No primeiro caso, verificou-se que não foram tomadas as medidas indispensáveis para que ela fosse alcançada. Em casos como estes, o caminho da história vai no sentido do agravamento do problema se não se verificar uma reconfiguração do dispositivo da oferta de cuidados de saúde, a montante dos serviços de urgência. Significando que se regrediu na satisfação das necessidades dos doentes, tendo crescido a desadequação do seu ponto de atendimento. Consequências: aumento do risco para os novos casos, além do episódio que os levou a procurar o serviço; aumento da despesa por a resposta se ter verificado em meio hospitalar .
Mas esta estatística é muito mais do que o seu valor. É principalmente o seu significado político. Resume tudo o que a tutela já devia ter começado a fazer quando anunciou os quatro pilares da reforma do SNS, e ainda nem sequer conseguiu lançar a primeira pedra. Chegando-se, com muita probabilidade, no final de 2016, àquele valor, descontada a promessa da tutela, está visto que houve muito que ficou por fazer, por opção própria, inevitavelmente, dada a circunstância política particularmente favorável em que se encontra o governo. E no plano da sobrevivência do SNS, este indicador tem também um significado bem diferente daquele que teria se estivéssemos na década de 90 do século XX, ou mesmo na primeira metade da década do século XXI. Agora existe e já está instalado em todo o território um poderoso sector hospitalar privado que espreita agressivamente todas as oportunidades e todas as falhas do SNS para crescer e se tornar dominante. Resumindo, este indicador configura implicitamente a celebração entre o sector público e o sector privado de um outro tratado de Tordesilhas: os centros de saúde para o SNS, os hospitais para os privados.
Se o primeiro-ministro não começar a tomar boa conta do que se está a passar no serviço público de saúde, enquanto a tutela vai colhendo flores de dormideira no jardim da Celeste, irá ter um sério problema político porque a direita não deixará fugir esta oportunidade para fazer deste assunto matéria de confronto, já que BE e PCP parecem estar confortáveis com a situação, pelo menos enquanto o aparelho de produção de urgências não gripar. Se e quando isso acontecer, pode ser que acordem para a realidade, como tem acontecido no passado.
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