Ginjinha e bolos-rei

Ginjinha e bolos-rei

Esta quadra festiva teve a particularidade de servir a MRS para explorar até à náusea a disponibilidade dos portugueses para aceitarem as manifestações que lhe são típicas, e que ele utilizou para reforçar a sua agenda política. A menos de um ano das eleições autárquicas e com o seu partido em completo desnorte, o aproveitamento que fez da agenda presidencial e os graus de liberdade que ela proporcionava é por demais indicativo das suas intenções para 2017. Estar onde houvesse um ajuntamento, ou sinalizar uma situação de maior impacto junto da opinião pública, tudo foi rastreado para que MRS estivesse presente e  todos esses acontecimentos fossem  tratados com a habilidade que se lhe conhece, e reconhece.

Recuperar a direita, principalmente o PSD, para dentro das fronteiras do poder governamental em 2019 é, desde o primeiro dia das suas funções, o objectivo estratégico que nunca deixou de estar presente na  agenda política de MRS. Para o efeito tem consciência de que tem de investir em dois tabuleiros, os quais, tanto quanto possível, hão-de saber distinguir-se no que  divergem e no que concordam: o tabuleiro do apoio ao governo, parasitando-o naquilo que sabe serem medidas que têm apoio da população, e o tabuleiro da quota de popularidade onde se joga o poder mediático de influência na vida política. Digamos que é na articulação das divergências e das convergências com o governo que ganha autoridade institucional e é no alargamento da base de apoio popular que ganha poder para impor soluções políticas. De todas, a promulgação em directo do orçamento do Estado representou simultaneamente o mais importante sinal de apoio instrumental ao governo e a maior manifestação de oposição à actual liderança do PSD. Esse foi o momento em que os militantes, simpatizantes e eleitores deste partido devem ter tomado consciência de que não deveriam contar com ele para recuperar o que a história já condenou. Mas não é por isso que se pode afirmar que MRS serve dois amos. Nisso há que se lhe fazer justiça, MRS só serve o PSD, mesmo quando  parece que está servir o governo.

Dito de outra maneira, os sinais de proximidade de MRS ao governo não deixarão de se fazer sentir, e porventura até reforçarem-se, enquanto no PSD se mantiver a sua actual direcção e enquanto a sua estratégica programática continuar a insistir em medidas de austeridade tal como ainda são defendidas. Estar associado ao legado do brutal aumento de impostos é qualquer coisa em que MRS não deseja envolver-se. Se os grandes braseiros brotam das pequenas faíscas, como certa vez afirmou Richelieu, todo este parasitismo institucional poderá ver-se alterado no caso de, nas eleições autárquicas, o PSD não sofrer perdas significativas e, por essa razão, o líder do PSD vir o seu poder reforçado e legitimado. Esse será o teste para se perceber o que MRS vai fazer da sua colecção de selfies, ginjas e bolos-rei. Por ora, e até Outubro de 2017, não o deixaremos de continuar a ver  numa roda viva, não fosse até lá não termos o Carnaval, a Semana Santa, e as idas ao banho.

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Cipriano Justo
cjusto@netcabo.pt

Professor universitário, e especialista de saúde pública. Transmontano de Montalegre, com uma longa estadia em Moçambique, dirigente associativo da associação académica de Moçambique e da associação dos estudantes da Faculdade de Medicina de Lisboa. Várias publicações, entre as quais sete livros de poesia. Prémio Ricardo Jorge e Arnaldo Sampaio.

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