26 Out E agora, António?
Desde que tomou posse, vai em breve fazer dois anos, António Costa defendeu duas ideias no que toca ao relacionamento de Portugal com as União Europeia, e em especial à arquitectura do €uro : o país deveria manter-se dentro dos critérios em vigor sem deixar de os criticar e de apontar para uma muito necessária revisão dos mesmos que permitissem encarar a moeda única como instrumento de convergência e não, como tem sido desde a sua criação, de aprofundamento da divergência altamente penalizadora dos países ditos periféricos (mas não só…); e deveria preparar-se para o “momento certo” em que pudesse por em cima da mesa a urgência das reformas – o qual só se antevia possível se entretanto Portugal se esforçasse por construir pontes com outros países membros do €urogrupo para criar uma plataforma comum (e lembro algumas reuniões que juntararm os paises mediterrânicos com essa finalidade, ou um encontro “tecnico” organizado pelo MNE). Ponto dado como assente: esse momento teria sempre de esperar pelas eleições nos países centrais da UE – pelo menos em França (Abril) e na Alemanha (Setembro). Ora, estamos já no rescaldo dessas duas eleições, e a pergunta que se nos coloca é: e agora, António ?
Os dois anos de governação de António Costa operaram uma mudança significativa no modo como nos relacionamos com o €urogrupo – deixando de querer ir ainda mais além da troika para passar a apresentar uma proposta alternativa que teve como elementos cimeiros a reversão de muitas politicas do anterior governo, a consagração da subida do salário minimo nacional e outras heterodoxias que nos foram “toleradas”. Poder-se-ia dizer: nós bem sabíamos que havia outra maneira de compatibilizar as “responsabilidades e compromissos europeus” com uma política económica e financeira de diversa índole, e uma vez que isso já foi conseguido, podemos estar descansados e deixar correr o marfim
Seria um lastimável erro. Por um lado, os mecanismos do €uro permanecem inalterados, e uma nova conjuntura pode também reverter a bonomia como Mario Centeno é recebido em Bruxelas quando os resultados aparecem e há fogos noutras paragens. Não devemos correr tal risco. Por outro, se é verdade que a economia tem dado mostras de recuperação e de responder positivamente aos estímulos que lhe tem sido dados (taxa de crescimento do PIB, baixa consistente do desemprego), muitas vozes tem defendido que essa resposta positiva se deve em grande parte à conjuntura externa que tem favorecido as nossas exportações, e depende pouco do dinamismo do mercado interno e do seu nível de procura. Ora, se assim é, há que admitir a hipótese de que uma política mais agressiva – e consequentemente menos alinhada pelo estreito canal que a €urolândia nos permite – poderia ter efeitos ainda mais positivos na recuperação de que precisamos para atingir de novo patamares onde já estivemos. Por isso, não devemos baixar os braços e registar a nossa satisfação com o que foi conseguido como se nada mais houvesse a fazer. A receita da procura interna, defendida no programa eleitoral do PS, pode não estar a dar resultados – mas não mostrou ser falaciosa, antes não se conseguiu afirmar plenamente (dados os constrangimentos do €uro)
Há cerca de um mês, António Costa fez uma importante intervenção no Colégio da Europa, em Bruges. Parecia querer retomar uma iniciativa com eco no grande forum europeu – e sou o primeiro a saudar tal iniciativa. Mas não posso deixar de notar que António Costa parece ter falado em nome de Portugal – como lhe competia – e não apareceu (pelo menos aos olhos da opinião publica) como o arauto de uma nova via que concitasse aplauso de países que vivem o mesmo drama que nós. Ficou um gosto a pouco – ou a poucochinho, como ele gosta de dizer. Onde estão os apregoados parceiros? Que esforços tem sido desenvolvidos para criar uma frente comum que desfaça a ideia de que temos um problema nacional e não uma questão de toda a União?
Mas o pior estava para vir a seguir. Numa entrevista ao PUBLICO, o nosso MNE resumia a posição (sua? de António Costa?) nos seguintes termos: “Precisamos da ambição francesa e da sageza alemã”. Que quererá isto dizer – se não é que diz tudo sem rodeios? Terá a alternativa que Costa prometeu construir com base nos países que sofrem a divergência sucumbido a uma dinâmica que tem como pólos dois países beneficiários do actual modelo do €uro? Terá a capacidade de iniciativa portuguesa ficado inibida pela apresentação do moderadíssimo programa de reformas europeias de Emanuel Macron – que tantas dores de cabeça daria à “geringonça” se fosse adoptado como modelo de virtudes, uma vez que a nível doméstico se encontra nos antípodas do consenso que sustenta o nosso governo? É essa a nossa ambição? Já para não falar na “sageza” alemã, que nem a substituição de Schauble no ministério das finanças se descortina esteja a emergir no nevoeiro que envolve a formação do próximo governo da Senhora Merkel… Ficamos então como actores secundários no filme em que Macron e Merkel continuarão a lutar pelos interesses franco-alemães? Voltamos ao papel de bons alunos que só tem uma pequena achega a dizer ao senhor professor?
Ou estamos à espera de outras eleição qualquer (Itália?) nos países com dificuldades? Ou do progresso da extrema-direita por essa Europa fora para fazer retinir mais campainhas de alarme – elas que já soam bem alto para as quem quer ouvir? A miragem da convergência, que animou tantos por essa Europa fora com a liderança de Delors, e que tornou a Uniãso Europeia apetecível no pós-Guerra Fria, é mesmo coisa de museu?
Por isso, a pergunta fica: e agora, António?
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