A vulnerabilidade das crianças e dos idosos no quadro da pandemia em Portugal

A vulnerabilidade das crianças e dos idosos no quadro da pandemia em Portugal

É impossível ficar-se alheio às últimas notícias que envolvem crianças e idosos, fortemente penalizados pela Covid-19. E remeto logo o tema para as crianças que são institucionalizadas e que ficam em isolamento mesmo com um resultado de teste –Covid negativo, e para os idosos a quem têm falhado organismos oficias e institucionais, quanto mais não seja pela falta da devida fiscalização aos lares que os acolhem.

A própria DGS reconhece que na primeira situação a “decisão é difícil” – e é-o, sem dúvida, para mais tendo em conta as implicações que poderiam ter para outras crianças acolhidas pela instituição. Mas isolar crianças e jovens, “arrancadas” às famílias (sim, é verdade que tantas vezes é esta a melhor solução quando a violência e a negligência tomam conta destes miúdos…) e ao seu ambiente num espaço exíguo, e sozinhas? Mesmo havendo, obviamente, o seu acompanhamento pela instituição, quem consegue imaginar uma criança a maior parte do tempo entregue a si mesma num espaço complemente desconhecido? Mais, quem se colocaria no seu lugar, fragilizada pelas circunstâncias que a conduziram ao lar de acolhimento, e sem o apoio psicológico e físico capazes, se não de as confortar, ao menos de lhes apaziguar os medos e a ansiedade natural e inerente a qualquer mudança e adversidade? Não seria de equacionar – sim, sabemos que a pandemia nos veio determinar novos comportamentos e há que minimizar os riscos – que alguém pudesse, mesmo que em turnos ou de forma rotativa, e devidamente equipado, assistir presencialmente e de forma mais contínua estas crianças? Para maior tranquilidade e vinculação das mesmas…Sim, parece-me a terminologia apropriada – uma relação de vinculação e proximidade que possa suprir de alguma forma a falta dos alicerces familiares (família cuidadora, família protectora…) essenciais à trajectória do seu desenvolvimento de vida. Como se já não lhes bastasse a vulnerabilidade própria da infância, vêm as próprias instituições reproduzir os modelos e a adversidade que as institucionalizou distorcendo-lhes ainda mais a afectividade e potenciando-lhes a tristeza. Quando as instituições o que deveriam era de amenizar os efeitos da separação familiar, prestando cuidados o mais presencial e próximo dos cuidados parentais, a estas crianças.

O mesmo acontece nos lares de acolhimento de idosos e unidades de cuidados continuados – também nestes os idosos poderão ser sujeitos ao isolamento no âmbito das normas instituída para lidar com a pandemia. Isto, além das notícias que têm vindo a lume sobre a falta de condições e condignidade nos cuidados destas pessoas, agilizadas pela falta de fiscalização e de auditorias nos lares – que são da responsabilidade da Entidade Reguladora para a Saúde! Perante a morbilidade e mortalidade nos lares portugueses (que não se circunscreveu ao lar em Reguengos…) não é mais do que tempo de rever os licenciamentos e de cumprir a vigilância e supervisão regulamentares nestes espaços para averiguar, e prevenir, as circunstâncias de prestação de cuidados aos idosos? Cuidados médicos incluídos! Para que as famílias e a sociedade em geral possam ter confiança nestas instituições como lugares de garantia de protecção e cuidado aos seus idosos.

E claro que nada do exposto coloca em causa a qualidade dos muitos bons profissionais que, tantas vezes sem recursos adequados às suas funções, desenvolvem trabalhos de excelência com estes utentes. Porque é ao Estado Português que cabe ser o regulador destas instituições e de facultar todos os meios necessários à sua laboração e à   defesa destas populações, mais vulneráveis. Crianças e idosos.

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Sílvia Vasconcelos
vasconcelos.silvia@gmail.com

Médica Veterinária, doutorada em Ciências Veterinárias, componente biomédica sobre os benefícios dos animais para saúde mental dos seres humanos. Actualmente dirigente nacional e coordenadora regional do Movimento Democrático das Mulheres, foi também deputada pela CDU na Assembleia Legislativa da Madeira. Foi ainda actriz no Teatro Experimental do Funchal, integrando vários projectos artísticos de teatro e de televisão desde 1986.

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