
17 Ago A ver se nos entendemos sobre a descentralização
Sobre as eleições autárquicas há a dizer que a anunciada e prometida descentralização acabou por não se realizar, e portanto tudo o que se diga ou venha a dizer sobre o assunto na campanha eleitoral, principalmente do lado Partido Socialista, é para desconfiarmos, ficarmos de pé atrás e o que mais seja aconselhável para não irmos em cantigas. É que semelhante medida, até com data marcada para ser aprovada, não deve ter o seu nome escrito na comunicação social sem que previamente tenha reunido as condições políticas para começar a ser aplicada. O contrário disso, que é o que está a acontecer, é lançar para debate não uma peça legislativa com estrutura suficientemente consolidada, mas um articulado desarticulado sobre o qual ainda se olha de lado. Quase dá vontade de dizer, vamos começar tudo de novo a ver se nos entendemos.
Sendo uma reforma com particular impacto sobre a vida das comunidades locais, a descentralização de competências ao favorecer o que é homogéneo sobre as diferenças nacionais, atribuindo poderes suficientes para serem tomadas decisões sobre o que mais interessa e faz a diferença na vida das pessoas, e para as quais há recursos que podem ser aproveitados e combinados da maneira a acelerar o desenvolvimento local e regional, a sua construção está a exigir vontade política para o que ainda não passando de ficção seja transposto para a realidade de todos os dias. Mas o mais preocupante das versões que se conhece, é a manutenção da lógica de compartimentação das organizações públicas, quando esta seria a melhor altura para ensaiar mecanismos de horizontalizarão das suas funções, dentro do espírito de cooperação e coordenação entre as partes que concorrem para os mesmos fins. Basicamente o risco a evitar é a transposição para o nível local da geometria das instituições nacionais. A oportunidade maior da descentralização é facilitar a captação das especificidades locais e torná-las num exercício sistemático de aprendizagem e conhecimento.
A campanha eleitoral das autárquicas de 1 de Outubro, ao contrário do que seria desejável, vai passar ao lado desta discussão. A participação da população contribuiria para esclarecer e descodificar o significado da descentralização, de maneira a que, mais do que uma medida administrativa, representasse um aprofundamento da democracia participativa, na medida em que o dispositivo legal era confrontado com o entendimento dos que potencialmente podem vir a beneficiar dele. Aliás, este divórcio representa uma das principais explicações para as contradições que se veem manifestando entre os mecanismos da democracia representativa e as exigências crescentes de as populações terem uma palavra a dizer sobre o que as leis se propõem fazer. Na vida política a relação de representação tem sido cada vez mais posta em causa. E a descentralização, mais do que qualquer outro, questiona esse modelo de decisão.
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